domingo, 7 de fevereiro de 2010

Agarrar a vida


"Já não consigo agarrar a vida" - e mostraste-me as mãos vazias de sonhos, sulcadas fundo pelo cansaço dos gestos repetidos mil vezes no escorrer dos dias silenciosos. E eu levei-te à varanda e mostrei-te as aves que partiam antes do anoitecer, escutámos o vento a rasar as copas das árvores, estendemos os braços para sentir a chuva escorregar por entre os dedos... Falei-te do mar. Do cheiro do mar que se nos agarra à pele, que salga os cabelos em ondas revoltas de maresia... Recordei-te o morno da areia debaixo dos pés, a pele marcada pelos grãos dourados, o grito das gaivotas em vôos de liberdade... E o pôr-do-sol, em avermelhados de infinita magia...
Agarra a vida. Agarra-a, peço-te. Agora já podes. Sabes...? Atrás da porta da entrada, penduradas no velho bengaleiro, ao lado do teu casaco verde, deixei-te as minhas asas...

4 comentários:

Joaquim do Carmo disse...

Mais um delicioso "golpe de asa"...

Com tais asas, ainda que "imperfeita", não é possível tombar - e o casaco verde, sinal de esperança, quiçá!

bj

Lídia Borges disse...

Não! Não entregues assim as tuas asas.
Ninguém é digno delas.
Quem não quer voar não saberá nunca usar asas.

Beijo meu

Anna disse...

Olá Quicas :)
Todos tombamos, todos rasgamos as asas no fundo dum sonho qualquer...Mas há sempre uma esperança que teimosamente ecoa no bater do coração... E é ela que nos reergue e nos faz voar de novo.

Bjo

Anna disse...

Lídia querida, como Ícaro, todos teimamos no vôo... Mas alguns de nós às vezes não podem ou não sabem voar. E precisam de um abraço... ou das asas de alguém que os ama.

Beijo