quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Um adeus em setembro


Quebrou-se a máquina azul do tempo
a que por vezes trazia
por dentro das metáforas
as folhas de Setembro.
Não resta mais do que melancolia.
Os anjos não descem das árvores
nem há duendes nos minutos.
As aves de arribação começam a partir
e deixam nas névoas da manhã
as últimas penas do Verão.

Manuel Alegre, "Elegia de Setembro" in Bairro Ocidental

sábado, 26 de setembro de 2015

Mareantes do vento


Crescemos na nudez das rochas

crescemos e desmaiamos
conforme as marés

Vertemo-nos líquidos
em caudais de sons
ardidos no sal
no delírio da espuma
por todo o corpo

Crescemos na substância das pedras
com asas muito leves

Não somos barco de carregar velas
somos mareantes do vento


Eufrázio Filipe, in Mar Arável (mararavel.blogspot.pt)

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Da espera


Esperar que voltes é tão inútil como o
sorriso escancarado dos mortos na
necrologia dos jornais

e no entanto de cada vez que
a noite se rasga em barulhos no elevador e
um telefone se debruça de um sexto andar

sinto que ficou ainda uma palavra minha
esquecida na tua boca

e que vais voltar
para
a
devolver

Alice Vieira, in Os Armários da Noite

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

OUTONO


De que lado viste chegar
o Outono? Por que janela
o deixaste entrar? És tu quem
canta em surdina, ou a luz
espessa das suas folhas?
Em que rio te despes para sonhar?
É comigo que voltas
a ter quinze anos e corres
contra o vento até te perderes
na curva da estrada?
A quem dás a mão e confias
um segredo? Diz-me,
diz-me, para que possa habitar
um a um os meus dias.

Eugénio de Andrade, in Obra Poética

Palavras de água


Através do teu coração
passou um barco
Que não pára de seguir sem
ti o seu caminho.

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Navegações

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Obrigada!




Foi uma noite cheia de uma magia inesquecível... Recebi beijos, abraços dados com lágrimas nos olhos e vontade de não largar, flores e poemas. Recebi os amigos que vieram cheios de risos e encheram a sala de perfume e de cor... Obrigada a todos os que estiveram presentes, e aos que queriam estar mas não puderam... Obrigada pela festa tão linda, em volta do meu livro.
Entrego-vos O Guardião do Silêncio, com todos os espaços em branco que eu quis deixar, com todas as entrelinhas para onde podem escorregar, onde podem aninhar-se a sonhar os vossos sonhos...
Os direitos de autor deste livro reverterão integralmente para o IPO do Porto. Porque sim.
O Guardião do Silêncio é vosso. Eu não tenho mais nada para oferecer.

Ana Paula Mateus

sábado, 12 de setembro de 2015

É hoje...!


Nunca um convite foi uma obrigação. Mas a sua presença será uma honra e uma alegria. 
As portas estão abertas, venha conversar connosco.

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Ver por dentro


Nós temos olhos que se abrem para dentro. Esses que usamos para ver os sonhos.

Mia Couto, in Estórias Abensonhadas

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Às vezes aqui faz frio


Contar-te que a chuva parou, e deixou o chão da cidade submerso num brilho escorregadio... Parou de mansinho, no entardecer quieto e quase frio deste outono já encostado ao fim dos dias, cada vez mais breves. Contar-te que a luz rasgada do sol poente - o último raio de sol - rompeu a medo os céus escuros e chegou dourada, numa maciez que trouxe de volta os pássaros. Contar-te nadas, pequenos nadas, - como tu dizias. Como terias repetido, se eu te tivesse telefonado só para te contar a morte da chuva. E terias rido, e terias perguntado se eu me tinha molhado, se tinha andado à chuva como uma miúda irresponsável... 
Ainda não apaguei o teu número de telefone. Continuo a querer contar-te: os pequenos nadas. A chuva miudinha, fria, batida pelo vento norte - que me encharcou até aos ossos, que me gelou a pele e me entrou no coração... Uma chuva igual, tão igual, igualzinha à do dia em que morreste... 
E é sempre esta chuva fria e triste que me faz regressar a ti, nos dias em que não sei de mim.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Da Solidão



Porque eu trazia rios de frescura
E claros horizontes de pureza
Mas tudo se perdeu ante a secura
De combater em vão

E as arestas finas e vivas do meu reino
São o claro brilhar da solidão.


Sophia de Mello Breyner Andresen, "Poema Perdido" in Obra Poética