quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

FELIZ ANO NOVO!


A todos os que por aqui passam e se demoram nas minhas palavras, desejo um 2009 cheio de felicidade...
Eu só peço tempo... para continuar a tocar as estrelas...

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Atrevo-me...


Atreve-se o poema
insinua-se, escorregadio...
desliza silencioso
nas pontas dos meus dedos.
Ganha corpo, impõe-se
nas ondas das palavras...

Escolho as mais doces,
as mais suaves, as de cor mais bonita
e com travo a maresia...
Procuro as palavras claras,
luminosas, como o teu sorriso de sol...

Preciso de dizer-te como é bom
atravessar contigo as estradas da vida,
Preciso que saibas que quero
as tuas mãos nas minhas
para romper os caminhos
do novo ano...

Atrevo-me no poema,
arrisco a prosa e a poesia,
só para te falar de amor.

Só para te dizer que te amo.


domingo, 28 de dezembro de 2008

Farrapos de memória


Nas traseiras da casa da minha avó, a seguir ao quintal, havia uma série de casinhas pequeninas clandestinas a que chamavam ilha. Na última casa da ilha, morava um pintor. Ninguém sabia o seu nome, a sua idade, a sua proveniência... De estatura alta e evidente magreza, tinha o cabelo todo branco e um bigode amarelecido pelo tabaco. Vivia sozinho, não falava com ninguém e nós, as crianças, tínhamos dele um medo terrível... Ninguém se atrevia a dirigir-lhe a palavra e eu gostava de o espreitar pela janela escancarada, enquanto pintava. Com o queixo apoiado no peitoril de madeira corroída e em bicos dos pés, ficava a observá-lo, fascinada, pintando indiferente ao mundo, ao correr das horas, o cigarro eternamente pendurado nos lábios, arrastando as palavras lentamente numa melopeia estranha, incompreensível, quase inaudível. Hoje acho que ele sabia que eu ali estava mas a minha presença era para ele tão indiferente como a das dezenas de gatos vadios que encontravam guarida naquele ateliê inusitado. O universo era dentro dele. A vida acontecia num lugar a que só ele tinha acesso, onde não deixava entrar mais ninguém. Na ponta dos seus dedos, nasciam fantasticamente mares muito azuis, sóis alaranjados, ondas verdes e amarelas de uma praia que só ele via... De vez em quando assobiava... e era uma música alegre, sem escorrências de nostalgia, de saudade ou solidão alguma, uma música que estalava ao sol como fogo de artifício na pequena ilha... e eu ficava ali, seduzida pela estranha criatura, supostamente escondida na minha inocência infantil, a vê-lo criar mundos coloridos e fazer nascer sons que lhe ecoavam lá dentro...
Um dia as janelas da casinha não se abriram. Os vizinhos estranharam... Outro dia, mais outro... E depois o relato breve, feito sem pormenores pela minha avó: o pintor morrera, encontraram-no morto em casa, na sua solidão, no estranho mundo paralelo que habitara entre nós. Partira tão só como chegara...
Ninguém lhe sentiu a falta. Talvez só para mim, a ilha nunca mais foi a mesma, com as janelas da última casa encerradas para sempre, vedando-me o olhar aos quadros pintados grosseiramente, vozes e gritos de liberdade de um ser humano estranhamente só, que assobiava a felicidade em ondas de alegria pura e pintava o mar de um tom inesquecível.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Sentido único


Um dia, quando olhares para trás, verás que os dias mais belos foram os dias em que lutaste.

Sigmund Freud

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

FELIZ NATAL!



A todos os visitantes deste espaço, desejo uma noite de paz e felicidade...
Um Natal cheio de amor e boa vontade.


terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Noite perfumada



O cheiro invade toda a casa, sobe etéreo a escadaria, ocupa o piso de cima... Está por todo o lado, este cheiro mesclado de canela, mel, limão... este cheiro quente a lenha ardendo com serenidade, crepitando alegre na minha lareira, estalando em gargalhadas queimadas com arrastada lentidão, este cheiro a velas e biscoitos acabados de cozer... É o perfume do Natal. Esta noite escorre já das paredes, infiltra-se nos armários e nos cantos mais escuros, inunda as gavetas numa onda morna de saudade. A memória não me trai, este é o cheiro do Natal, o mesmo de que lembro desde que existo, o cheiro do Natal da minha infância. Sento-me cansada a olhar a serenidade da casa adormecida... É um cansaço bom, o cansaço quente e perfumado da véspera de Natal. Todos os anos se repete e é sempre o mesmo. Todos os anos sinto esta magia que se aproxima silenciosa, se insinua no escorregar das horas, deixa o coração ternurento e agasalhado... Deixa o meu corpo pesado, cansado, desejando repousar no teu abraço, querendo encostar a cabeça no teu peito e ouvir o bater do teu coração, nesta quietude perfumada de uma noite mágica e única que se faz anunciar com meiguice...
A noite de Natal.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Cá dentro


Há momentos tão únicos, tão especiais, que não importa onde estamos porque a vida acontece dentro de nós e não lá fora.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Palavras...


E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

David Mourão-Ferreira, E por vezes

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O relatório


É oficial: estou a ficar demente. Insana. Psicótica.
Desde que me lembro, sempre tive um medo terrível de me esquecer de datas ou documentos importantes, de não cumprir prazos, de falhar de algum modo profissionalmente... Nas alturas de muito trabalho, dou comigo a rever a agenda vezes sem conta para confirmar as datas das reuniões, a verificar até à exaustão que todos os relatórios, fichas, planos, gráficos, actas, estão prontinhos e perfeitos. E hoje, como de costume, comecei a preparar o material para a reunião de sexta-feira, para que nada falhe, para que nenhum documento seja esquecido por algum colega mais distraído. E faltava mesmo um documento, um relatório. No intervalo, abeirei-me da colega responsável pela falha e lembrei-lhe da necessidade absoluta de ter o papelito pronto até sexta-feira. Ela olhou-me visivelmente desnorteada e disse-me que já mo tinha dado na semana passada. Foi a minha vez de mostrar surpresa e garanti-lhe que não, que ela estava baralhada, talvez tivesse sido a outro Director de Turma... ou se calhar tinha sido colocado directamente no dossiê da Direcção de Turma... Talvez num errado... Entreguei-to em mãos, não te lembras?- afiançava ela, o olhar cheio de uma enervante certeza. Não, não me lembrava... Mas dei-lhe o benefício da dúvida e dediquei-me à ingrata tarefa de esvaziar a minha gorducha e pesada pasta. Verifiquei, com gestos nervosos, todos os papéis, todos os envelopes, todos os dossiês, um por um, e... nada. Nem sinal do relatório. A irritação aumentava mas tentei serenar... talvez não tivesse visto bem... repeti a busca, agora ainda com mais cuidado. Nada de novo. Do relatório nem cheiro, nem rasto. E agora? Que maçada ter de andar atrás dos colegas, pedir pelas alminhas, zelar para que sejam cumpridas todas as formalidades atempadamente, lembrar da necessidade de ter tudo pronto para que a reunião corra sobre rodas... Enfim... Voltei a falar com a colega e calmamente expliquei-lhe que não tinha o relatório e que ela teria de fazer outro. Não gostou. Não gostou nadinha. Mas eu dei-to!-reafirmava já sem ocultar os nervos. Pois, mas eu não o tinha, paciência, se calhar tinha-o perdido... (como é que se perde um relatório?) era mesmo necessário fazer outro. E com esta regressei a casa e tentei serenar. Mas não estava bem, uma inquietude áspera roçava-me a pele, desviava-me a atenção dos gestos rotineiros, sobressaltava-me a concentração. Decidi procurar de novo, esventrar a pasta e radiografá-la se necessário fosse... Mas não foi necessário... Mal a abri, quase imediatamente os meus olhos tropeçaram numa folha extremamente familiar... puxei-a e não queria acreditar...! O relatório fantasma, preso com um clip a um outro documento, sorria-me desdenhosamente, trocista, atirando-me à cara toda a minha nervosa cegueira... Ele estivera sempre ali, o tempo todo, e eu tinha passado por aquele sorriso escancarado vezes sem conta e não o tinha visto, aquele riso escarninho e desprezível de quem troça da desgraça alheia, soara com certeza alto, muito alto e eu não o tinha ouvido...
Amanhã vou pedir desculpas à colega. Muitas vezes, mil vezes, e implorar-lhe que seja paciente comigo... É que eu estou a ficar demente. Insana. Psicótica.

domingo, 14 de dezembro de 2008

sábado, 13 de dezembro de 2008

Fundo...


"Conheço-te muito bem!"- disparaste tu com um olhar de fogo que não deixava lugar a réplicas. E eu calei-me... mas apetecia-me dizer-te que uma pessoa é quase sempre a ponta visível de um iceberg... Que uma pessoa tem abismos, tem lugares escondidos, tem precipícios onde se debruça desafiando o equilíbrio. Uma pessoa tem muitas vezes portas fechadas à chave, fantasmas adormecidos nos tectos poeirentos, tem oceanos profundos dentro do peito. Uma pessoa tem lugares desconhecidos aonde nunca foi, aonde nunca se atreveu a ir... Uma pessoa tem gavetas com fundos falsos e jardins proibidos, tem buracos negros como o universo...
Apeteceu-me mandar-te calar porque devias saber que uma pessoa é sempre muitas pessoas...

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Palavras aladas


Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada...

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais.

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam
E eles aos corações não voltam mais...

Raimundo Correia, As Pombas

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

As coisas que tu dizes...


Juras a pés juntos que o homem nunca foi à lua e não há quem te demova. Esta verdade inabalável é dita com um sorriso trocista, levantando a ponta do véu da suspeita transformada em certeza irredutível: filmagens de estúdio, montagens feitas com a ajuda de sofisticados computadores.Nada mais fácil do que simular um cenário desértico e branco, uma alunagem feita por gente envergando roupas estranhas e volumosas. E o povo néscio engole a história. Dizes tu. Eu não te contrario.
Do mesmo modo, tens a estranha teoria de que os mortos não se vão embora, de que ficam connosco e vivem a nosso lado, traindo-se no ranger das portas e dos soalhos, no estalar das vidraças, no estremecer das flores nas jarras, nas correntes de ar inesperadas e improváveis, nas sombras súbitas que se te atravessam no corredor da casa tranquila e vazia. O teu gato consegue vê-los, aos teus mortos que te povoam as assoalhadas cintilantes, quando fica estranhamente quieto, pupilas enormes e negras fixas num ponto qualquer, o pêlo eriçado e o corpo estranhamente estacado... todo ele nervos e atenção de predador selvagem. Os mortos que o teu gato vê, envelhecem, adoecem, ficam rabujentos ou alegres, riem e cantam, choram de tristeza... e não te metem medo... As coisas que tu dizes!...
Acreditas também que aqui expiamos os nossos pecados, pagamos o preço dos erros cometidos em muitas outras vidas... e que o Homem e a Mulher são apenas metades de uma laranja que Deus cortou e espalhou aos sete ventos quando criou o mundo. Por este motivo, só nos completamos com um único ser humano à face da terra. Um único. É pois missão de cada um de nós procurar a metade onde encaixamos, e quando a encontrarmos não devemos desviar o olhar, devemos lutar para a preservar, destruir todos os muros que nos separam.Quando isto não acontece, a nossa metade procurar-nos-á em outra vida, fazendo-se ouvir de modo estranho: objectos que desaparecem misteriosamente ou são trocados de lugar sem alguém lhes mexer, o rádio que subitamente toca mais alto, um cheiro estranho a perfume vindo do nada, invadindo todos os aposentos, uma luz que falha por instantes... Está sempre a acontecer e são eles. Dizes tu. São eles brincando connosco, são eles que se riem da história do Homem que foi à lua e afinal não consegue curar o cancro e a SIDA, não sabe como salvar os oceanos, como evitar as guerras, a fome, a dor e a miséria... As coisas que tu dizes! Ir à lua é tão fácil! Basta um computador e uma simulação perfeita. Difícil, difícil mesmo, é encontrar a metade da nossa laranja. Por isso os mortos de alguém nos acariciam o cabelo ou nos puxam os pés na cama em longas noites de insónia. São apenas meias laranjas que procuram a outra parte, incansavelmente, como uma sina escrita por um deus cigano que do Além tatuou palavras imortais e feitiços inquebráveis nas palmas das nossas mãos.
As coisas que tu dizes...!

sábado, 6 de dezembro de 2008

Palavras de Amor


Nunca pensei. Achei que ia ser para sempre: aquela coisa ao mesmo tempo boa e inquietante, colada às costelas, indizível, tão forte, uma coisa esquisita, suave e alucinante ao mesmo tempo, sim, várias coisas ao mesmo tempo, que eu trazia dentro do corpo, inalienável, como uma doença dos rins ou dos pulmões, mas uma coisa incurável (...)
Nada disso. Caminhava na rua sempre com esta sensação dentro de mim, esta felicidade, esta benção, vejo agora que era maldição, de que não me podia libertar mas era minha, tão minha como as minhas pernas ou os meus braços, tão minha como do meu pobre e inquieto coração.
(...)
- Amor? Não sei, não tenho a certeza se era amor. Acho que era muito mais. Uma coisa sem nome. Não, isto era muito mais...

Rosa Lobato de Faria, As Esquinas do Tempo

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Sentido único


O jogo do Amor é um jogo de forças. Quanto mais se ama mais fraco se é.

Vergílio Ferreira, Conta-Corrente

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

A propósito de política...


Anda a apetecer-me há muito tempo falar da Sra. Ministra da Educação... mas felizmente tenho-me segurado.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Boa-noite avó


A minha avó era uma pessoa doce. Era um ser humano bom, muito bom. Possuía um altruísmo que toda a vida tentei imitar e adorava rir e perder-se em conversas de todo o género. A sua enorme sabedoria popular não lhe dava ares de altivez, pelo contrário, era humilde como uma flor campestre. Ensinou-me a cozinhar, a bordar, a fazer crochet e malha, a arrumar uma gaveta, a limpar a casa, a dobrar lençóis e a pôr a mesa... A minha avó fazia-me os vestidos para as bonecas e punha cera no chão da casa de joelhos, a cantarolar. Era ela quem me penteava o cabelo todos os dias antes de sair para a escola, com a boca cheia de ganchos que me espetava cuidadosamente na indomável cabeleira aos caracóis. A minha avó cheirava a canela e a alfazema. A minha avó tinha uma letra bonita, redondinha, que desenhava a lápis quando fazia as listas de compras com a língua de fora... A minha avó ensinou-me as letras, os números, a tabuada e as primeiras contas. Eu amava-a muito. Perdi-a há catorze anos e desde então, raro é o dia em que não a evoque com carinho e muita saudade. Às vezes, tenho muito medo de esquecer o seu sorriso e procuro então as fotografias que lhe tirava com uma Canon pesada demais para as minhas mãos pequeninas, depois de ela se ter penteado porque fazia questão de estar bonita. A minha avó era bonita. E adorava provérbios, possuía um vasto repertório e a todo o passo, em qualquer situação, lá disparava um adágio a propósito. Foi com ela que aprendi a gostar de provérbios e aprendi-os todos. Mas havia um que eu não entendia, nunca compreendi, e era o seu preferido. Ela bem me explicava, bem tentava, mas as palavras ficavam a pairar em mim sem fazer algum sentido... Hoje compreendo-o finalmente. Hoje sei, avó, o que querias dizer quando deixavas cair o teu provérbio preferido. Talvez seja por isso que venho evocar-te hoje, para te dizer que tu tinhas razão quando me dizias com o olhar subitamente cauteloso ou definitivamente nublado: Meu amor, "O Homem faz planos e Deus ri-se".

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Em Dezembro


Impossível não notar... A cidade engalanou-se, vestiu-se de luz e cor, há música nas ruas, nas lojas alegres, onde as pessoas se acotovelam já a comprar os presentes que a quadra exige... Por todo o lado, pais natais, bonecos de neve, renas, bolas coloridas, guirlandas, estrelas, laços e fitas abraçando embrulhos, sinos e presépios, cânticos e sorrisos, acções de beneficência e vendas de caridade, filantropia e solidariedade a jorros...
E no entanto, impossível não notar... Os passos apressados de quem percorre as montras de olhar vazio, as mãos carregando o peso de mil angústias, os corações vazios de sonhos. Tanta gente só, tantos idosos tristes e abandonados, tanto ser humano transpirando frio e fome, tantos gestos denunciando um negro desalento... Nas lojas quentes, nas ruas agora tão bonitas, lado a lado, tanta desigualdade nas emoções de corações iguais...
O Natal não tarda... mas não chega a todo o lado e não é para todos.
Impossível não notar.
Em Dezembro.

1 de Dezembro


Dia Mundial da Luta contra a SIDA.
Aqui fica o meu abraço.

domingo, 30 de novembro de 2008

O poema possível


Apetece-me um poema
que ainda não está escrito.
Procurei-o em todo o lado
mas nenhum me fala do teu riso
ou tem o aroma dos morangos,
sequer o travo amargo do chocolate...
Apetece-me um poema
que traga todas as cores
e aqueça o frio escuro
deste Novembro que se despede.
O meu poema único não existe...
Poeta nenhum o rascunhou
para ilustrar isto que sinto...
Esta espécie de saudade ácida
do abraço quente de um dia de sol,
este silêncio onde fico
desalentada, porque não há
um poema possível.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Sentido único


Os políticos e as fraldas devem ser mudados frequentemente e pela mesma razão.

Eça de Queirós

domingo, 23 de novembro de 2008

Carpe Diem


Com o passar dos anos, damos connosco de repente a enveredar por caminhos que nos parecia impensável escolher, a proferir palavras cujo sabor desconhecíamos, a abrir portas que nos assustavam, a ver ruir certezas que julgávamos inabalavéis. Subitamente, estranhamo-nos nos gestos espontâneos, nos sorrisos quase felizes que escorregam de olhares imprevistos... E percebemos então, assim de repente, que de nada adianta fazer planos porque a vida nos troca as voltas, nos armadilha as passadas mais seguras. A vida, esse carrocel de emoções, essa montanha russa de imprevistos, conduz-nos a lugares insondáveis e oferece-nos pequenas alegrias que de tão inesperadas, provam que não há planos possíveis e que afinal, a matemática, a mais exacta das ciências exactas, na sua exactidão também se engana. Não, de nada adianta prever a vida ou rascunhar o futuro...
É por tudo isto que agora já não vou fazendo planos a longo prazo. Vivo um dia de cada vez, saboreio os instantes, delicio-me com os pequenos momentos que consigo agarrar... Aqueles que a memória grava e o coração aninha com carinho.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Inquietude


Houve qualquer coisa de áspero na textura deste dia que me arranhou a pele, me inquietou o pulsar do coração... Como se me tivesse faltado cumprir um gesto... ou me tivesse esquecido de acarinhar um sonho.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Pedaços de alegria


Quero entregar-te todos os pedaços da minha alegria. Carrego-a comigo, encostada ao olhar arredio que te atiro para que não a notes ainda, para que não ma descubras na ponta dos meus gestos trémulos e sorridentes. Ainda não é tempo... para já não quero denunciar-me, não posso permitir que a adivinhes no brilho indecente dos meus olhos envergonhados... Talvez amanhã... Talvez eu te ofereça todos os pedaços da minha alegria.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Sentido único


Os grandes navegadores devem a sua reputação aos temporais e tempestades.
Epicuro

quinta-feira, 13 de novembro de 2008


Esta flor é para ti.
Porque é a tua preferida.
Porque me apeteceu beijar-te, assim, a meio do dia.
Porque tu sabes porquê.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

domingo, 9 de novembro de 2008

Um post de quatro patas


Há pessoas que não gostam de bichos.
Os chamados animais de companhia, causam-lhes repugnância, provocam-lhes alergias, enchem-lhes a casa de odores, sujidade e pêlos. São uma prisão, destroem os cortinados, os tapetes e os sofás, roem os chinelos preferidos, arrancam as roupas do varal, escavam a terra dos vasos à procura de tesouros perdidos, deitam-se sempre na sua poltrona preferida, roubam a comida de cima dos balcões ao menor sinal de distracção e além disso, exigem imensa atenção... Uma verdadeira maçada...! Estas pessoas estão no seu direito... claro que sim. Têm, sem dúvida alguma, uma vida mais serena do que um amante dos animais... As pessoas que não gostam de bichos nunca alimentaram uma cria a biberão, nunca se preocuparam com as horas certinhas do antibiótico de um animal doente, nunca fizeram um curativo a um bicho ferido; estas pessoas nunca saíram do quentinho da sua casa para ir procurar na noite gelada um amigo que se perdeu, não ficaram de olhos abertos no escuro a imaginar se ele teria comido e bebido, se estaria ainda vivo, se acharia o caminho de volta... ou se alguém que o pudesse amar o teria recolhido e tratado tão bem como nós... As pessoas que detestam animais nunca ajudaram uma fêmea a parir, nunca ultrapassaram na estrada os limites de velocidade para chegar a tempo de entregar um animal atropelado ainda com vida nas mãos salvadoras de um veterinário... Nunca choraram por um cão ou um gato, nunca os viram envelhecer nem se sentiram de luto no momento de enterrar e dizer adeus a um companheiro de longos anos... Não sabem talvez o que é a saudade apertada que o coração acusa durante as férias que se demoram porque o nosso bicho não viajou connosco... Desconhecem a sensação gratificante que é regressar a casa todos os dias e ser recebido por um meigo par de olhos que nos esperou arrastando as horas vazias e se sente feliz por nos ver, que nos ama e nos é fiel sem exigir nada em troca... Não saberão talvez nunca, qual o sabor do momento em que a família escolhe o nome e prepara o ninho que acolherá um cachorrinho ou um gatinho... Não darão consigo a sorrir enquanto observam um filho a brincar doidamente com um animal e não conhecem a cor dos minutos em que quando a alma dói e o nosso bicho o pressente, se vem deitar silenciosamente na cadeira vazia a nosso lado e ali fica, só porque sim... Nunca escovaram ou lavaram um ser peludo, nunca sentiram a calma regressar ouvindo apenas o ronronar de um gato ou acariciando com ternura o pêlo sedoso de um cão...
Sim, há pessoas que odeiam bichos... e eu respeito-as... mas tenho para mim que há uma dimensão grandiosa da vida e do amor que lhes passa completamente ao lado...

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Sentido único


Uma das vantagens de sermos desorganizados é que estamos constantemente a fazer descobertas emocionantes.

A. A. Milne

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Palavras fechadas


Há portas
que é melhor
fechar para sempre.

Há portas
que é melhor
não abrir nunca.

Adília Lopes, Caderno

domingo, 2 de novembro de 2008

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Anjos da Guarda


Não precisamos de vê-los, tocá-los, para lhes sentir a presença, encostada de mansinho às nossas emoções. Nem sempre têm asas mas possuem o dom de voar até nós, quando nos sabem feridos nalguma curva esconsa dos caminhos da vida. E sorriem sempre, um sorriso cheio de sol que nos ilumina a hora mais negra e enche de calor o minuto mais gelado. Chamam-se anjos da guarda. Ou simplesmente amigos. São insubstituíveis, entram-nos no coração e ali ficam, seguindo-nos os passos inseguros, amparando-nos o deslize das lágrimas, abraçando-nos o riso alegre. Aos anjos da guarda tudo é permitido... Mesmo que nos dispam a alma, nos desnudem as emoções, cheguem sem avisar e se instalem na nossa vida corrigindo-nos a rota do marear inseguro...
Às vezes perdemos um anjo da guarda... porque a vida é uma viagem e as paragens são inúmeras e inesperadas. Rasga-nos o coração vê-los partir, sentimo-nos de repente desamparados e a navegar à deriva, mas consola-nos a ideia de que nenhuma partida é completa e definitiva, de que nos reencontraremos noutros sítios, noutras paragens e reconhecer-nos-emos de imediato. Porque os amigos não se conhecem, reconhecem-se. E assim, quando temos que perder um amigo, só devemos sufocar a dor e a saudade, limpar as lágrimas e dizer baixinho, daquele jeito que só os anjos ouvem: " Boa viagem... e até sempre!"
E a vida continua... E eles continuam... em nós... cá dentro... connosco.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Parágrafo


Porque há sempre uma palavra que ainda não foi pronunciada e que dará rosto a um capítulo que um dia, finalmente, nos atrevemos a escrever.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Ponto final


Faz hoje um ano. (Um ano é muito tempo?)
Deixei o olhar vaguear de novo por todos os textos que escrevi e pelas imagens que os ilustram, num curioso exercício reflexivo. Muitos dos posts seria capaz de os reescrever rapidamente e sem cábulas. Noutros páro, demoro-me um pouco mais, estranho-me... procuro-me. Sempre tentei ser cuidadosa com as palavras porque conheço o seu poder. Munidas duma força infinita, elas podem criar ou destruir, amar ou odiar. Talvez por isso, entre o momento em que o texto nasce e o minuto em que é publicado, decorre algum tempo... Procuro as palavras, espero-as muitas vezes e quando nascem é exactamente aquele o rosto que quero dar-lhes. Não, não há nada mais poderoso do que as palavras...
Hoje, um ano depois, eu não sou a mesma pessoa que timidamente deu corpo a este espaço. Surpreendo-me a recear as palavras, a temer-lhes o voo, a prever-lhes a queda... Hoje sei que é perigoso soltá-las, dar-lhes vida, permitir-lhes a rebeldia... Quantas vezes, nesta ilha que também foi ponte, estrada, caminho, as palavras se revoltaram e seguiram rumos diferentes dos traçados pelos meus dedos! Quantas vezes não consegui interromper a torrente e ela se tornou rio caudaloso desaguando em mares inesperados... Tenho hoje a certeza nítida que não sei escrever. Mas não é por isso que desisto... não... no dia em que achar que escrevo bem, deixo de o fazer. É só tempo de reconhecer que um dia todas as vozes se calam e ficam apenas os silêncios, também eles cheios de palavras que nascem cá dentro e aqui morrem. E dou comigo a precisar desses silêncios, dou comigo a querer cortar as asas às palavras. Por isso, este blog que eu adoro e onde repouso as inquietudes, deixou de fazer sentido. Esta viagem ao sabor das palavras termina aqui. Iniciar-se-ão talvez outras porque a alma humana, naturalmente inquieta, precisa de partir mas também de chegar, precisa de sonho e de realidade... E eu sou apenas isto, um ser humano vulgarmente imperfeito com uma última noite que reclamo como só minha, uma voz que hoje se faz ouvir talvez pela última vez. Por isso, e por uma questão de coerência, os comentários a este post, se os houver, não serão publicados.
Olho à minha volta para este mar onde viajei e naufraguei em tempos de tempestade e de calmaria, donde parti e aonde cheguei, onde fui tantas palavras, tantas imagens, e começo lentamente a fechar a janela. O momento é de suavidade e quietude... sinto-me serena e a tristeza esvoaça com meiguice no áspero sal de uma lágrima teimosa...
Um ano depois, saio silenciosamente sem olhar para trás e bato a porta da minha alma suavemente nas minhas costas.
Com mão firme, o coração apertado e os olhos cheios de água, coloco agora o ponto final.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Palavras limpas


Não faças da tua vida um rascunho. Poderás não ter tempo de passá-la a limpo.

Mário Quintana

domingo, 19 de outubro de 2008

Vai passar...


Entrei em silêncio com receio de te acordar. A casa acusava já o frio do anoitecer e o céu triste reflectia-se na vidraça da sala. Lá fora, junto aos umbrais, as aves em revoadas barulhentas procuravam refúgio para a geada nocturna. O corredor respirava tranquilo e ouvia-se música, algures num outro andar. Abri a porta do quarto com mil cuidados mas afinal não dormias... Às voltas com os teus pensamentos, esperavas-me e sorriste feliz quando nos abraçamos. Quiseste ver-me bem, pediste-me para acender a luz, comentaste a minha magreza, a palidez, os olhos encovados... estiveste a chorar...? E o inquérito começou: se tenho comido bem, dormido direito, alguma preocupação ou tristeza escondida...? Chamaste-me minha pequenina e quiseste que eu me deitasse junto de ti. Naquele abraço quente que só as mães têm, brincaste com os fios do meu cabelo, elogiaste o meu perfume e ali ficámos... como quando eu era a tua pequenina e caía da bicicleta, esfolava os cotovelos porque tropeçava a saltar à corda ou esmurrava os joelhos a andar de patins... Nessas alturas, por entre as minhas lágrimas e a água oxigenada que com ternura me punhas nas feridas, dizias-me calma e muito baixinho:"Vai passar... Vais ver que vai passar...". E sempre passava.
Hoje, enquanto falavas, eu recuei muitos anos a essa infância onde tudo passava só porque tu dizias as palavras mágicas, com certeza e confiança, repondo tudo no seu lugar, espantando o medo, sarando feridas... Mas hoje as feridas são outras... Hoje, ambas sabemos que nem tudo passa, que há dores e feridas que não têm cura, que há lágrimas que não secam e mágoas que não se espantam. Apesar disso, nesse abraço sentido, quase juro ter ouvido a tua voz, sussurrando entre o bater dos corações um eco que gravei cá dentro: "Vai passar..."

sábado, 18 de outubro de 2008

As ondas das palavras


Gosto de palavras salgadas,
como a palavra maresia
que sabe à espuma das ondas
ao morrer da tarde...
Gosto de palavras torneadas,
como a palavra esperança,
que se pode enrolar
serpenteando entre os dedos
e me faz lembrar
as ondas do teu cabelo.

... sabias?

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Palavras...


Se me escolheres
Me quiseres como te quero
Se pegares em mim
E me guardares
Protege-me
E abriga-me
Não me deixes fugir
Não me largues
E faz-me tua
Faz-me tão tua
E única
E diferente de todos…
Se me escolheres
Me quiseres como te quero
Ama-me sempre
Sem mentira
Sem medo
Sem vontade de fugir
Com vontade de querer
E com desejo
De viver, rir
Crescer…
E faz de nós Um
Tão forte, grande
Único
Como a escolha feita
De nos querermos
Neste para sempre
Que é só nosso
Agora…

Maria Ana Ferro, Se me escolheres

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Palavras exactas


Escrever é ter a companhia do outro de nós que escreve.

Vergílio Ferreira, Escrever

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Equilíbrio


Há coisas na vida que nos parecem difíceis de resolver.
Receamos não encontrar o equilíbrio.
E no entanto, é possível.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Um sorriso azul


Deixaste cair o teu sorriso tão azul e pousaste-o na mesa, entre nós. Um pouco amarrotado pela espuma dos dias, ali ficou a brilhar docemente, como uma luz que me guia os passos, me norteia o sentir.

sábado, 11 de outubro de 2008

Sem Palavras...


Com palavras se fazem coisas
com elas se desfazem.
As palavras não decifram
são enigmas
matéria obscura
luminosa.
Com palavras se navega
com palavras se naufraga.

Com palavras.

Manuel Alegre, Com palavras

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Palavras caladas


La forma de querer tú
es dejarme que te quiera.
El sí con que te me rindes
es el silencio. Tus besos
son ofrecerme los labios
para que los bese yo.
Jamás palabras, abrazos,
me dirán que tú existías,
que me quisiste: Jamás.
Me lo dicen hojas blancas,
mapas, augurios, teléfonos;
tú, no.
Y estoy abrazado a ti
sin preguntarte, de miedo
a que no sea verdad
que tú vives y me quieres.
Y estoy abrazado a ti
sin mirar y sin tocarte.
No vaya a ser que descubra
con preguntas, con caricias,
esa soledad inmensa
de quererte sólo yo.

Pedro Salinas, La Forma de Querer Tu