quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Perdas...


Se ainda estivesses connosco, hoje festejaríamos o teu aniversário.
Haveria bolo, champanhe, presentes cuidadosamente escolhidos (tu nunca querias nada, nunca precisavas de nada) e cantar-te-íamos os parabéns sentados à mesa, com os teus olhos a brilhar muito, iluminando a noite, aquecendo a vida.
Olho a tua fotografia sobre a cómoda e sorrio-te sempre que os nossos olhares se encontram... Evoco-te vezes sem conta, num terror de te perder a memória, de deixar apagar os pormenores... Falo de ti aos meus filhos, tecendo o fio das histórias que não quero ver desmaiadas, esquecidas.
Ainda te choro... Fazes-me tanta falta! Não sei já quantos anos farias, não me lembro há quantos anos partiste...nem quero fazer contas. Não me interessa saber quantas léguas mede a estrada da minha saudade.
Beijo-te com uma ternura infinita (quem disse que não podemos beijar um Anjo da Guarda?) e abraço-te com a serena certeza de que dava tudo para te ter aqui...
Parabéns, minha querida, onde quer que estejas.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Palavras livres


A liberdade só existe quando o amor está presente. Quem se entrega totalmente, quem se sente livre, ama plenamente.
E quem ama plenamente, sente-se livre.
Essa é a verdadeira experiência da liberdade: ter a coisa mais importante do mundo, sem a possuir.

Paulo Coelho, Onze minutos

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

AVISO

Neste espaço não há limites para a imaginação, não se cortam as asas aos sonhos e é permitido ser feliz.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Palavras partidas


Disseram-me que não se pode quebrar o coração a alguém que o já tem partido. E eu pensei

Pode

Podemos sempre partir os bocadinhos do coração em bocadinhos ainda mais pequenos, amachucar ainda mais o que nos resta, como se nos tirassem o último sopro de vida.


Patrícia Reis, Morder-te o coração

domingo, 27 de janeiro de 2008

Estropício


Um dia chamaram-me estropício. A palavra doeu-me, é um termo que não fazia parte do meu léxico, que não uso para me exprimir e talvez por isso, soou estranha como uma desconhecida, agressiva aos meus ouvidos. A situação era inusitada, eu a tentar fazer compreender o meu ponto de vista e a colidir frontalmente, violentamente, com opiniões diferentes. Eu, a elevar o tom de voz, a voar contra o vento, a remar contra a maré. Eu, a ser um estropício! Talvez tivesse merecido o vocábulo, naquela altura. Mas o episódio sanou-se e a palavra ficou. Passei a usá-la frequentemente, a amar a fonética das vogais e o tom sibilante que a veste. Hoje, quando estou em rota de colisão com alguém, penso no substantivo e no seu significado. Teremos nós o direito de ser estropícios na vida dos outros? Nem sempre nos fazemos compreender, nem sempre conseguimos compreender o mundo, mas... existe desde então o fantasma do estropício, o medo de travar os passos alheios, obrigando-os a tropeçar em nós. Ninguém tem esse direito, com efeito. Então, que fazer quando não nos conformamos com as fronteiras, as barreiras, os muros, as mãos que nos empurram, os silêncios, os sinais vermelhos e os de sentido proibido?
Uma pessoa razoável conformar-se-ia e desistiria.
Um estropício...também.

sábado, 26 de janeiro de 2008

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Ilhas


Hoje finalmente conseguiste falar.
Disseste tudo, sentada na minha frente, os olhos baixos, duas lagoas de água doce ameaçando transbordar, tornar visível a dor que te roía. Falaste baixo e calmamente, mas as palavras saíram numa torrente inesperada, sem precisares de as escolher, de as procurar. Saíram-te. Assim, como quem abre uma porta encerrada há muito e deixa entrar a vida em jorros de luz.
Eu já sabia sem que mo tivesses dito antes. Chama-lhe intimidade. Coisas evidentes aos olhos de quem nos vê e invisíveis para quem só olha para nós. E eu tinha já percebido a falta de brilho, de luz, no teu sorriso; o constante morder dos lábios; os círculos negros emoldurando-te o olhar distante, traindo as noites mal repousadas; o tremor das mãos; o salto brusco quando te chamavam de repente ou quando o tom era mais alto, mais imperioso; os esquecimentos constantes numa profissional irrepreensível; o verniz escarlate lascado nas bordas; a raiz do cabelo sem retoque de cor há tempo de mais; até o teu casaco, de bom corte como todas as tuas roupas, denunciava vincos e rugas de uma alma esquecida de si... E hoje finalmente contaste-me. Sem que eu to tivesse pedido, sentada na minha mesa, brincando distraidamente com a chávena de café já fria, já esquecida, lavaste a alma e o olhar. Ao ouvir-te, foi como se me estivesse a ouvir a mim própria, a tua voz ecoava dentro de mim num dueto ensurdecedor que calava tudo o resto à nossa volta. Eu pouco ou nada disse, mas senti-me aliviada como se da minha alma se tivessem exorcizado também segredos e dores pesados de mais, carregados de mais...
E quando te levantaste e partiste, fiquei sozinha com a mágoa infinita de que o mundo não devia ser assim, um lugar deserto, implacável, onde cada ser humano é uma ilha isolada e perdida, esgotando-se e consumindo-se na sua própria dor, à vista de todos e sem ninguém ver. Diariamente.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Palavras guardadas


Reaprendo o caminho das mãos
através do inútil.

Releio incansavelmente
a tua única carta.

Não choro, penso.

Quero ainda seguir o teu voo
o trilho que soube convidar os teus passos

Sentir o que sentes
levar o coração ao teu destino.

Estendo as mãos para a luz
Ficam acesas como se o teu corpo
as convocasse.

Tecemos um amor indestrutível.

A vida é que não sabe.

Rosa Lobato de Faria, A gaveta de baixo

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Palavras únicas


Quem foi que à tua pele conferiu esse papel
de mais que tua pele ser pele da minha pele

David Mourão-Ferreira, Pele

domingo, 20 de janeiro de 2008

Às claras


Como é que não consegues
decifrar-me a alma
se é tudo tão claro,
tão nítido e evidente,
se podes ler em mim
como em livro aberto?

Não há segredos cá dentro,
não há enigmas no fundo,
apenas linhas e entrelinhas
que ainda não leste,
que ainda não viste.

Já tentaste?
Tenta de novo...

sábado, 19 de janeiro de 2008

Saudade


A ausência diminui as paixões medíocres e aumenta as grandes, assim como o vento apaga as velas, mas atiça as fogueiras.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Palavras iniciais

Creio que foi o sorriso,
sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.

Eugénio de Andrade, Rente ao dizer

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

HAPPY


Que bom meter a chave à porta e entrar, deixando lá fora, no tapete, o pó da estrada.
Que bom despir o casaco com os bolsos carregados da sombra dos dias.
Que bom pousar no chão o peso das horas doídas e vazias.
Que bom correr as cortinas de luz do meu abrigo quente.
Que bom sentir o coração assim, cheio de paz.
Que bom estar aqui.
Que bom regressar a ti.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Palavras lúcidas


Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta
Continuará o jardim, o céu e o mar,
E como hoje igualmente hão-de bailar
As quatro estações à minha porta.

Outros em Abril passarão no pomar
Em que eu tantas vezes passei,
Haverá longos poentes sobre o mar,
Outros amarão as coisas que eu amei.

Será o mesmo brilho, a mesma festa,
Será o mesmo jardim à minha porta,
E os cabelos doirados da floresta,
Como se eu não estivesse morta.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Quando

sábado, 12 de janeiro de 2008

Caminhos


São sinuosos os caminhos do coração...
E por vezes, a única forma de continuar em frente, é dando um passo atrás.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Palavras humanas


(Sei que andas por aí, oiço os teus passos em certas noites, quando me esqueço e fecho as portas começas a raspar devagarinho, às vezes rosnas, posso mesmo jurar que já te ouvi a uivar, cá em casa dizem que é o vento, eu sei que és tu, os cães também regressam, sei muito bem que andas aí.)
(...)
(Esta noite atiraste ao ar a tigela da água, como costumavas fazer sempre que estava vazia, esqueci-me de enchê-la, ouvi-te perfeitamente a sacudi-la, estavas a chamar por nós, não disse nada a ninguém, ainda vão julgar que estou a ouvir coisas, mas logo não me esquecerei, podes estar descansado, quando vieres verás que a tigela está cheia, se a dona perguntar por que lhe ponho água, direi que são hábitos, ou talvez não, talvez lhe diga a verdade: O cão está cheio de sede.)
(...)
(Sei muito bem que as pessoas saem dos retratos, sei isso desde pequeno, mas tu não, estás proibido de voltar a fazer o que fizeste esta noite, não posso entrar na sala e ver outra vez a tua moldura vazia.)

Manuel Alegre, Cão como nós

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Um sorriso


Promete-me que não mudarás...
Que guardarás o sentido de humor,
esse jeito de dar a volta à vida,
mesmo em marés adversas
e nevoeiros densos
que me roubam a luz,
me fazem perder o norte...
Promete-me que terei sempre
a claridade do teu riso
no escuro do meu pessimismo,
na rota das minhas lágrimas,
para não me perder.
Promete-me que o eco
da tua alegria sincera
continuará a acompanhar-me
neste marear inconstante
de ondas alterosas
e quietas águas espelhadas.
Que serás sempre a amarra
que me descansa a viagem,
a âncora onde posso repousar a alma
e aonde regresso após cada partida.
Promete-me que será em ti
cada anoitecer
e que amanhecerei sempre contigo.
Promete-me... Sorrindo.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Palavras seculares


O polvo com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge; com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela; com aquele não ter osso nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa, o dito polvo é o maior traidor do mar. Consiste esta traição do polvo primeiramente em se vestir ou pintar das mesmas cores de todas aquelas cores a que está pegado.Se está nos limos faz-se verde; se está na areia faz-se branco; se está no lodo, faz-se pardo; e se está em alguma pedra, como mais ordinariamente costuma estar, faz-se da cor da mesma pedra. E daqui que sucede? Sucede que o outro peixe, inocente da traição, vai passando desacautelado, e o salteador, que está de emboscada dentro do seu próprio engano, lança-lhe os braços de repente, e fá-lo prisioneiro. Fizera mais Judas? Não fizera mais, porque nem fez tanto. Judas abraçou a Cristo, mas outros o prenderam; o polvo é o que abraça e mais o que prende. Judas com os braços fez o sinal, e o polvo dos próprios braços faz as cordas. Judas é verdade que foi traidor, mas com lanternas diante; traçou a traição às escuras, mas executou-a muito às claras. O polvo, escurecendo-se a si, tira a vista aos outros, e a primeira traição e roubo que faz é à luz, para que não distinga as cores. Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é menos traidor!

Padre António Vieira, Sermão de Santo António aos Peixes (texto com supressões)

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Direito de Resposta


Ouve-me. Mas ouve-me bem.
Tenho sido educada, mais paciente do que Job, vou tolerando o teu desprezo, o teu cinismo, mas ouve-me agora.
Dizes que escrevo mal, que tenho uma prosa simplória e uma lírica imatura... que sobrecarrego os atributos, sufoco os nomes, inverto a ordem dos complementos circunstanciais e assassino toda e qualquer oração adverbial... Dizes até que escolho mal os prosopoemas, os poemas e que são ridículos os excertos prosaicos que selecciono, absurdos os recursos estilísticos, as conexões sintácticas e a semântica das frases... que é previsível e pobre o meu jogo vocabular... que estafo até à exaustão as suspensões frásicas... Juras a pés juntos que não sei pontuar... Pois bem, ouve-me só desta vez: Não me leias. Não o faças porque ninguém to pede e eu agradeço-to. Porque insistes em ler-me?
Porque o fazes, todos os dias, como se eu fosse um ritual imposto cumprido religiosamente, clicando nos "Favoritos", engolindo os meus textos como um purgante intragável? Imagino-te num descontrolado impulso alcoviteiro, a espiares-me os grafemas, a passares-me a pente fino as sílabas, à espera de encontrares uma falha, como lobo vigilante em silenciosa emboscada...
No fundo, tu sabes que eu sei porque o fazes. Tens todo o direito, mas poupa-me às farpas, à língua viperina, ao veneno que destilas com inveja e desdém, ao vómito mal disfarçado de rancor. Poupa-me aos teus discursos sem plateia porque eu não te aplaudo.
Não é para ti que eu escrevo, por isso... não me leias!

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Palavras inesperadas


Desejo dizer que há gente que não acredita em amor à primeira vista. Outros, ao contrário, além de acreditar afirmam que este é o único amor verdadeiro. Uns e outros têm razão. É que o amor está no coração das criaturas, adormecido, e um dia qualquer ele desperta, com a chegada da Primavera ou mesmo no rigor do Inverno. (...)
De repente, o amor desperta de seu sono à inesperada visão de um outro ser. Mesmo se já o conhecemos, é como se o víssemos pela primeira vez e por isso se diz que foi amor à primeira vista. Assim o amor do Gato Malhado pela Andorinha Sinhá.

Jorge Amado, O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá

domingo, 6 de janeiro de 2008

Dia de Reis


Hoje é Dia de Reis e encerra-se a quadra natalícia.
Os Reis Magos são personagens que vieram do Oriente, guiados por uma estrela, para adorar o Deus Menino, em Belém. Este é um episódio relatado no Evangelho de S. Mateus, de forma muito resumida e vaga. Com o passar do tempo, foram-se acrescentando detalhes, para se sanarem as lacunas deixadas no Evangelho em relação a esta história.
A designação "Mago" era dada à classe dos sábios ou eruditos, contudo esta palavra também era usada para designar os astrólogos. Isto fez com que, inicialmente, se pensasse que estes magos eram sábios astrólogos, membros da classe sacerdotal de alguns povos orientais, como os caldeus, os persas e os medos. Posteriormente, a Igreja atribuiu-lhes o apelido de "Reis".
Quanto ao número e nomes dos Reis Magos, são tudo suposições sem base histórica, aliás algumas pinturas dos primeiros séculos mostram dois, quatro e até mesmo doze Reis Magos adorando Jesus. Foi uma tradição posterior aos Evangelhos que lhes deu o nome de Baltasar, Gaspar e Belchior (ou Melchior, ou ainda Melquior), tendo-se também atribuído a cada um características próprias. Belchior seria o representante da raça branca (europeia) e descenderia de Jafé; Gaspar representaria a raça amarela (asiática) e seria descendente de Sem; por fim, Baltasar representaria todos os de raça negra (africana) e descenderia de Cam. (Jafé, Sem e Cam são os três filhos de Noé, que segundo o Antigo Testamento representavam as três partes do mundo e as três raças que o povoavam naquele tempo). Estavam assim representadas todas as raças bíblicas (e as únicas conhecidas na altura: os semitas, os jafetitas e os camitas). Pode então dizer-se que a adoração dos Reis Magos ao Menino Jesus simboliza a homenagem de todos os homens na Terra ao Rei dos reis. Mesmo os representantes dos tronos, senhores da Terra, curvam-se perante Cristo, reconhecendo assim a sua divina realeza.Esta ideia só surgiu no século XVI, assim só a partir deste século é que se começou a considerar que Baltasar era negro, de forma a que se pudesse abranger todas as raças.Para além desta simbologia, pela cultura cristã, os Reis Magos simbolizam que os poderosos e abastados devem curvar-se perante os humildes, despojando-se dos seus bens e colocando-os aos pés dos demais seres humanos, ou seja, devem partilhar a sua fortuna com os mais pobres.Também em relação às idades dos Reis Magos tudo são suposições sem verdade histórica. Só no século XV, se fixou que Belchior teria 60 anos, Gaspar 40 anos e Baltasar 20 anos. O dia de Reis celebra-se a 6 de Janeiro, partindo-se do princípio que foi neste dia que os Reis Magos chegaram finalmente junto ao Menino Jesus. Em alguns países é no dia 6 de Janeiro que se entregam os presentes. Ao chegarem ao seu destino, os Reis Magos deram como presentes ao Menino Jesus:- Ouro (oferecido por Belchior) e que representa a sua nobreza;- Incenso (oferecido por Gaspar), representa a divindade de Jesus;- Mirra (oferecido por Baltasar) é uma erva amarga e simboliza o sofrimento que Cristo enfrentaria na Terra, enquanto salvador da Humanidade, simbolizando também Jesus enquanto homem. Assim, os Reis Magos homenagearam Jesus como rei (ouro), como deus (incenso) e como homem (mirra).
Com a chegada dos reis magos, cumpre-se a profecia: "Os reis de toda a Terra hão-de adorá-Lo".

Parabéns, Filha!


Entro devagarinho, em bicos dos pés, para não te ferir. Sei que não gostas de conversas profundas, de intimidades escancaradas à luz do sol... mas sabes, hoje tenho mesmo de falar para ti, de te desejar Feliz Aniversário, assim ao ouvido, só entre nós. Estás crescida, caminhas já sozinha, na ponta dos pés, já chegas mais alto e vês mais longe...
Quando nasceste e te puseram sobre o meu peito, eras um ser humano minúsculo, cor-de-rosa, macia, perfumada, vulnerável e indefesa. Carne da minha carne e sangue do meu sangue. E eu senti um medo terrível de não conseguir proteger-te, de não saber defender-te, orientar os teus passos na dança da vida. Mas quando te aninharam nos meus braços, cravaram-te também no meu coração e hoje eu percebo que um filho nunca deixa de fazer parte de nós, que há cordões que nunca se cortam... Os teus sucessos são os meus sucessos e as tuas lágrimas ardem-me cá dentro como fogo. Nunca partirás de mim, definitivamente, porque o amor entre pais e filhos é tão inquestionável e inevitável como o nascer do sol, todos os dias.
Às vezes, quando te observo sem que tu saibas, sinto um orgulho gigantesco por aquilo em que te tornaste. Quando te vejo dançar, feliz, no palco da vida, com esse brilho nos olhos e um sorriso nos lábios, ficas tão bonita! Carregas a beleza de uma jovem de bem com a vida, serena com o mundo e os outros. De bem com o coração. E sinto uma alegria inexplicável, invade-me uma onda de felicidade pelas escolhas que tu fazes, pelas vitórias que alcanças, pelos êxitos que somas.
Hoje precisas cada vez menos de mim mas queria dizer-te que estarei sempre aqui. Quando a vida te ferir e tiveres os pés em sangue, terás sempre o meu colo, os meus braços, o meu amor para te sarar; quando subires ao palco para receber aplausos e flores, procura-me perto de ti, na tua sombra, porque nunca te largarei. E não precisas de falar, de me chamar, porque quando estenderes a mão, a minha já estará entre as tuas.
Não prevejo o teu futuro, não sonho sonhos por ti nem para ti... esse é o teu papel, compete-te traçar os teus rumos... mas se tiveres dúvidas na escuridão da noite, na trovoada dos dias, caminharemos juntas até que não precises do meu ninho e possas voar sozinha, com as tuas próprias asas, robustas e seguras.
Hoje é o teu dia. Vive-o bem, vive-o feliz, porque é só isso que eu ambiciono para ti. Desejo não te desapontar nunca, nunca te desiludir e ser capaz de te dizer que te amo todos os dias. E eu amo-te tudo.
Parabéns, filha. Sê feliz!

sábado, 5 de janeiro de 2008

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Palavras ocultas


Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida,
Parece-me que foi noutras esferas,
Parece-me que foi numa outra vida...

E a minha triste boca dolorida,
Que dantes tinha o rir das primaveras,
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim...

E as lágrimas que choro, branca e calma,
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!

Florbela Espanca, Lágrimas ocultas

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Marés...


... Também o mar é assim:
Uivante em vaga alterosa
Parecendo querer tudo alcançar,
Tudo destruir!
E, contudo... ele, por fim,
Transforma-se em onda amorosa
Tão manso... que até no seu ondular
Parece sorrir...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Palavras evidentes


E foi assim que descobri que todas as coisas continuam para sempre, como um rio que corre ininterruptamente para o mar, por mais que façam para o deter.
Sabes, quem não acredita em Deus, acredita nestas coisas, que tem como evidentes. Acredita na eternidade das pedras e não dos sentimentos; acredita na integridade da água, do vento, das estrelas. Eu acredito na continuidade das coisas que amamos, acredito que para sempre ouviremos o som da água no rio onde tantas vezes mergulhámos a cara, para sempre passaremos pela sombra da árvore onde tantas vezes parámos, para sempre seremos a brisa que entra e passeia pela casa, para sempre deslizaremos através do silêncio das noites quietas em que tantas vezes olhámos o céu e interrogámos o seu sentido. Nisto eu acredito: na veemência destas coisas sem princípio nem fim, na verdade dos sentimentos nunca traídos.
E a tua voz ouço-a agora, vinda de longe, como o som do mar imaginado dentro de um búzio. Vejo-te através da espuma quebrada na areia das praias, num mar de Setembro, com cheiro a algas e a iodo. E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre.

Miguel Sousa Tavares, Não te deixarei morrer, David Crockett

terça-feira, 1 de janeiro de 2008