quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Eclipse


Reza a lenda que no início eram as trevas.
E Deus criou o Sol para iluminar a Terra. Mas as noites eram longas e escuras. E Deus criou a Lua.
Depois chamou-os a ambos e disse-lhes:
- Tu, Sol, serás o astro-rei. Farás nascer a vida, serás o responsável pelo nascimento, crescimento e bem-estar de todos os seres vivos. E tu, Lua, iluminarás a noite, serás o refúgio e a companhia de todos os poetas e enamorados, e comandarás a voz do mar.
Acontece que quando se viram pela primeira vez, o Sol e a Lua apaixonaram-se completa e perdidamente. No entanto, logo compreenderam que o amor dos dois seria sofrido e infeliz porque com a decisão e as ordens de Deus, jamais poderiam encontrar-se. Era o primeiro amor impossível da história do Mundo. Por isso viviam irremediavelmente tristes, sabendo que não poderiam nunca amar-se em plenitude.
Mas Deus é Pai e é bom. Assistindo à dor dos dois e comovido com a grandeza e nobreza daquele sentimento, decidiu que nenhum amor no Mundo seria impossível, nem mesmo o do Sol e da Lua.
E Deus criou o eclipse.
Durante o eclipse, por breves momentos, o Sol e a Lua encontram-se, cruzando finalmente os seus caminhos e podem amar-se por alguns minutos. Nessas alturas, o brilho de ambos é tão intenso que não é aconselhável olhar directamente para o céu, nem invadir a privacidade do raro encontro dos dois amantes. Casos houve, em que seres humanos se atreveram a perturbar esta intimidade e foram punidos com a cegueira, provocada pelo brilho e luz resultantes do abraço dos dois corpos celestes. Por isso, devemos baixar humildemente os olhos e respeitar um momento de amor tão belo que Deus, compadecido, permitiu que acontecesse.
Assim reza a lenda.


O eclipse desta madrugada foi o último da década. Muitos anos passarão até que o Sol e a Lua possam voltar a ver-se e a amar-se fugazmente e com certeza, foram muitos os olhares curiosos que se voltaram para o céu, desrespeitando a intimidade do momento, querendo presenciar um amor tão único.
Eu adoro a lenda e adoro histórias de amor. E confesso, espreitei o céu esta madrugada, com uma pontinha de inveja, para tentar ver o amor do Sol e da Lua, um amor infinito que sobrevive à distância e à ausência e está condenado à solidão eterna.
Confesso, espreitei o céu esta noite... E tu?

5 comentários:

Anónimo disse...

Eu não. No entanto, o que nunca deixo de espreitar, são os MARAVILHOSOS textos postados por deprofundis! Eles alimentam-me a alma e fazem-me sonhar. Em suma: fazem-me mais feliz!

Bj grnd.

Anónimo disse...

O ritmo encantatório e a simplicidade da prosa transportaram-me ao reino encantado do "Era uma vez..."
Texto docinho,este!

Um beijinho

Anónimo disse...

É tão feio espreitar,senhora doutora!
(ok, eu também tentei...mas não vi nada).
O teu texto é lindo...adorei.

Bjinho :)

Anónimo disse...

Este post é super hiper mega original.Amei!

Beijoka

Anónimo disse...

Será caso para dizer "Quem espera desespera" ou "Quem espera sp alcança"?
Escreve sempre...eu gosto de te ler.

Bj