segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Um sentido Adeus


Fez hoje uma semana que ela morreu e eu continuo sem conseguir encontrar as palavras. Lido mal com a morte, ela rouba-me a voz e deixa-me num silêncio negro e vazio... E contudo, queria ser capaz de me despedir, de lhe dizer todas as coisas que nunca lhe disse, embora acredite que ela as soubesse. Queria encontrá-la amanhã ou depois, sentada à mesa do café, na mesma cadeira de sempre, na solidão dos seus dias infinitamente iguais, lendo ou bordando, lanchando a torrada e a meia de leite sempre à mesma hora, sempre à mesma temperatura... Queria poder sentar-me junto dela, como tantas vezes fiz, conversando sobre o tempo e os livros, sobre as pernas que não lhe obedeciam, sobre as análises ao sangue e o exame ao coração, enfiando as agulhas com linha preta e vermelha e branca, com que ela pacientemente bordava a ponto de cruz os polvos, os barcos, os peixes, em toalhas e em panos que depois me oferecia, só porque sim. Queria contar-lhe que guardo os livros que ela me deu nas estantes do coração, a segunda edição das obras completas do Camilo Castelo Branco que tem aquele odor maravilhoso dos livros antigos agarrado às páginas amarelecidas pelos anos e os cantos das folhas dobrados pelos dedos de todos os leitores apaixonados... Queria confessar-lhe que guardo na carteira, junto dos cartões de crédito, as pajelas dos santos que me ofereceu com carinho para que me protegessem do cansaço e da doença... Queria abraçá-la, sentir o cheiro a lavanda do perfume que usava, e dizer-lhe que tenho saudades... Do sorriso, muitas... E da alma linda que ela tinha. Queria que ela soubesse que nunca a esquecerei...
Por tudo isto lido tão mal com a morte... Ela rouba-nos os que amamos, definitivamente, e deixa lugares vazios no coração que vão ficando mais frios à medida que percebemos que afinal não tivemos tempo, nem encontrámos nunca as palavras certas, ou as possíveis, para dizer Adeus.

11 comentários:

Maria Campos disse...

Não tenhas saudades da sua alma linda, porque as almas lindas, nem a morte consegue apagar.


Bjú.

Pedro Gaivota disse...

Só Deus tem os que mais ama...


Would you know my name
If I saw you in Heaven?
Will you be the same
If I saw you in Heaven?
I must be strong
And carry on
'Cause I know I don't belong
Here in Heaven

Would you hold my hand
If I saw you in Heaven?
Would you help me stand
If I saw you in Heaven?
I'll find my way
Through night and day
'Cause I know I just can't stay
Here in Heaven

Time can bring you down
Time can bend your knees
Time can break your heart
Have you begging please
Begging please

Beyond the door
There's peace
I'm sure
And I know there'll be no more
Tears in Heaven

Would you know my name
If I saw you in Heaven?
Will you be the same
If I saw you in Heaven?


Tears In Heaven de Eric Clapton

Sentidas condolências do
Pedro Gaivota

Anna disse...

Um beijo, Maria.

Anna disse...

Obrigada, Pedro.

Um beijo

Isa Maria disse...

a eterna saudade que fica em nós com a partida dos entes querido..Um sentimento que não se explica.

jinhos meus

Anna disse...

Não só não se explica, como também não se aceita.
Obrigada pela visita, IMaria.

Beijinho

mi@mara disse...

A morte por mais cruel que seja faz parte dum processo que todos conhecemos, mas que nem sempre aceitamos.
Cabe-nos fazer um esforço e guardar o que de melhor nos foi tirado...
Força! A vida continua, temos que continuar com a nossa missão.
Bjs

Anna disse...

Obrigada pelas palavras, mi@mara.

Um beijinho

Anónimo disse...

"Voltei", de voltar, de ficar e "saborear" a seiva que por aqui corre!
Afinal, parecendo "por fora", sinto-me como tendo por aqui pousado todos os dias! Espero que, no meu "novo" espaço, também possa sentir-se bem - está a dar-me algum trabalho a adaptação ao word press e, por isso, tenho visitado muito pouco os amigos sem os quais não passo - é o seu caso, ainda que possa não parecer!...
Não sei de que perda se trata, sinto que é UMA PERDA importante, a avaliar pel' "Um sentido Adeus"!
Com a minha solidariedade, pelo muito que me comoveu e encantou, peço a sua permissão para publicar este post no meu "in_er_te" - eu nunca consegui dizer assim "Adeus" aos que a morte me tem roubado!
Beijinho e... até já!

Anónimo disse...

Amiga, não o referi mas, obviamente, se me autorizar a publicação pedida, indicarei a respectiva autoria!
De qualquer forma, obrigado!
Beijinho

Anna disse...

Quicas, ainda bem que voltou :)
Vou visitá-lo já de seguida. E claro que sim, tem toda a autorização para publicar o meu texto, em partes ou na íntegra. Sinto-me muito honrada por considerar que ele lhe pode ser útil. Obrigada pelo carinho.

Beijnhos