quarta-feira, 13 de maio de 2009

Da Morte


E, finalmente, falaste de morte. Como se o assunto, adiado há tanto tempo entre nós, despisse por fim o véu proibido e se soltasse livre, suspenso no ar à nossa volta. Falaste sem angústia, sem pudores a amordaçarem-te o fluir das palavras, num tom de voz muito baixo e muito calmo. Pousaste o assunto entre nós e deixaste-o ficar, deixaste-o ganhar corpo e forma até se tornar muralha alta, impossível de contornar. Contaste-me do medo. Esse medo frio que sentes por seres tu a próxima a abrir a porta à morte... Olhas em volta e já não há ninguém mais velho do que tu, quando as pancadas soarem, és tu que vais abrir a porta por onde há-de entrar a morte, essa ceifeira implacável que te levará para longe de mim, para sempre para longe de mim... Não havia revolta na tua voz, nem pena. Só havia medo. Repito, havia medo. Um negro medo de morte. Um medo gelado da morte.
Depois fugi. De ti, de mim, da dor dessa morte que anunciaste... Saí sem olhar para trás e pude, só então, chorar.
Mas muitos pedaços de mim ficaram lá, contigo, encostados ao teu medo.

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