quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O último comboio


Às vezes, a vida coloca-nos num cais de embarque e oferece-nos um bilhete dourado para uma viagem só de ida, rumo a um destino de sonho. Encontramo-nos então parados, malas feitas, coração apertado, o bilhete dançando nervosamente entre os dedos... e sentimos medo. Pés colados ao chão, o frio da indecisão encharcando-nos a alma, sabemos que aquele é o momento do tudo ou nada. Se entrarmos naquele comboio, nunca mais poderemos voltar. Sabemos isso e esperamos um pouco mais, esperamos até que tenham entrado já todos os passageiros... E passamos em revista a vida, a que temos e perderemos se embarcarmos... tentamos imaginar a que nos espera no fim da linha... E sentimos medo de novo. Muito medo. Alheio a tudo, o comboio apita estridentemente assinalando o último minuto. E agora? Arriscamos tudo ou perdemos tudo? E o medo continua a grudar-nos os pés, incapazes de caminhar, aperta-nos o peito enquanto vemos o comboio iniciar lentamente a sua marcha, rindo-se com desdém da nossa covardia, levando com ele um punhado de sonhos que nunca veremos cumpridos. Porque aquele era o último comboio... Porque aquele era o único bilhete que a vida nos dera.
E pelo resto do tempo, não importa quantos anos se vivam, quando a madrugada nos roubar o sono e inquietos vaguearmos pela casa serena, embrulhada num silêncio gelado, a dúvida surgirá, aguçada como uma lâmina, de como teria sido se naquele dia, há tanto tempo atrás, tivéssemos agarrado os nossos sonhos e embarcado no último comboio.

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