sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Todas as Cartas de Amor são ridículas


Barcelona, 21 de Dezembro de 1990

Querida Dani:
É quase...quase Natal. Arranjei finalmente forças e coragem para te escrever.Tu sabes que eu me atrapalho todo com as palavras, não tenho muito jeito para a escrita e parece-me sempre que as coisas não me saem como eu gostaria exactamente de as dizer ou que tu não as entenderás como eu as sinto.
Talvez estejas a pensar o que quererei eu a esta hora, com esta carta tão a despropósito.Bem, na verdade só quero desejar-te um feliz Natal. Nada mais. É que sabes, para mim não seria Natal se não te escrevesse, se não pudesse estar aqui contigo a sós, só mais uma vez. Queria explicar-te (porque parece-me que nunca entendeste) o que significas para mim. Apesar do longe, da distância, nem um só pedacinho de mim deixou de amar-te desesperadamente. Sinto saudade...muita saudade. Não é aquela saudade negra, que dói, que rasga, que faz chorar, não, não é essa. É uma saudade doce que me acompanha todo o dia, enquanto trabalho, como, descanso ou respiro, simplesmente. É a saudade de quem sabe que os ponteiros do relógio não andam para trás e se há coisas que o tempo nos rouba, também nos dá. E a mim deu-me a sabedoria para poder viver esta nossa ruptura. No princípio era horrível, sabes? Vivia desassossegado, inquieto, a todo o passo perguntava à secretária se me tinham ligado, se havia recados, espreitava a caixa do correio todos os dias, na esperança de que te tivesses lembrado de mim, de que me sentisses a falta. Agora não. Agora vivo apaziguado a nossa separação apesar de me acompanhares para todo o lado, todos os segundos do meu dia. E desde que te conheci, nunca mais me senti só. Quando as coisas ficam insuportáveis, penso na claridade do teu riso, na luz dos teus olhos ou no calor das tuas mãos. É tudo quanto me basta para repor a tranquilidade que tento alcançar. Mas hoje, pensar que não passarei contigo o Natal, deixa-me sufocado e aqui estou eu a escrever-te, a tentar construir a ponte que te traga até ao abrigo do meu peito.
O teu silêncio, eu entendo-o. Dói-me, mas entendo-o. E respeito-o. Imagino muitas vezes o que teria acontecido se eu tivesse ido ao teu encontro naquela noite há tanto tempo, se o avião tivesse partido a horas, se tu tivesses podido esperar por mim...Talvez tudo tivesse sido diferente. Talvez. Algures, em algum tempo, eu aprenderei a viver sem ti, apesar de morares no meu peito, donde nunca te arrancarei porque tu és a música dos meus silêncios... E é uma deliciosa sentença, essa de seres tu, tudo em mim.
E isto é tudo o que eu te queria dizer. Desejo-te, do fundo do coração, um feliz Natal. Imagino-te já rodeada dos teus, num ambiente quente e alegre e sei que nessa noite a minha memória não te assaltará os pensamentos, não te ensombrará o olhar, não terás um nó na garganta que te sufoque as gargalhadas felizes ou te tolha os gestos ternurentos. Nessa noite não haverá espaço para mim dentro de ti. Quanto ao meu Natal, será passado, como podes imaginar, a sós contigo.

Deixo-te aquele beijo...

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