Pousava as palavras no papel como se fossem andorinhas alinhadas nos beirais ao entardecer. Depois elas ganhavam vida, rodopiavam no céu do texto e conseguiam pintar a cor das sombras escorrendo pelos umbrais, ou o silêncio de um raio de sol refulgindo em volteios de luz no calcário das estradas. Gostava da escrita difícil, onde prendia o instante único de um sorriso que ilumina o rosto inteiro, a vertigem dentro do peito, o desabar de uma lágrima serena e secreta, que se prende e esmaga entre os lábios... Escrevia como amava, num impulso que arrasta o coração e o deixa por fim rasgado e aos pedaços, espalhado pelas frases, derramado nas palavras, tingindo com o seu sangue as linhas dos dias... Gostava da música das palavras, da água das palavras, do brilho das palavras.
Um dia decidiu deixar de escrever e calar-se para sempre. Porque um dia percebeu que as palavras também matam e ferem, arrasam e reduzem a pó...
Percebeu finalmente que as andorinhas são difíceis de apanhar também na escrita e que nenhum dos seus textos, por muito que tentasse, faria voar um coração humano.
E foi então que algo dentro de si escureceu e se silenciou para sempre.
4 comentários:
Simplesmente belo!
LeChateau
Obrigada, LC :)
Beijo
Porque o fizeste calar?
:(
:))
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