segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O poente da saudade


Desfaz-se
em espuma
a onda fria da espera
desfaz-se
em sal
o eco do teu nome

Desfaz-se o tempo
e o sonho e o vento
tudo se desfaz
assim tão devagar

E a gaivota
rasando o poente
com asas de luz
não sabe
que desfaz
em mim o silêncio
Não sabe
que me afogo
no sargaço da memória
Não sabe
que me enterro
no poente da saudade

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Palavras (im)previstas


Que surpresa
a dos dedos
quando percorrem o corpo

ou espalham os cabelos
pelas costas
despidas

Em breve será o ventre
e em seguida

as pernas lentas
mansamente erguidas

Maria Teresa Horta, Imprevisto

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

É meu!


O Prémio Literário Correntes D'Escritas/Fundação Dr. Luís Rainha, foi atribuído à obra Sete Estórias do Vento Salgado da autoria de Ana Paula Mateus, que concorreu com o pseudónimo Anna Sophia Moraes.
As ilustrações são da autoria de Esgar Acelerado.

(Hoje, nas estações de rádio da minha cidade)

É hoje!




segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

A posse do sonho


Eu sei que não sou nada e que talvez nunca tenha tudo. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Fernando Pessoa

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cá dentro


E depois há dias em que acordo assim, com uma estranha colada a mim, espalhada pelos sinais da minha pele, diluída no meu sangue, emaranhada nos fios do meu cabelo. Uma estranha a devorar-me em silêncio. A roer-me. A viver-me por dentro.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Chamo-te "meu"...


Chamo-lhe meu. O meu mar. Não que tenha sobre ele qualquer direito de possessão mas o meu coração reclama-lhe a pertença. Porque é preciso saber amar o mar. E não conheço nada mais fascinante, mais insondável e misterioso, mais perturbador ou belo... Gosto de tudo nele, da maneira como muda de cor, do cheiro, da meiga mansidão azul dos dias quentes e mais, muito mais, da fúria incontida das vagas alterosas que se elevam em espuma e força, que rebentam no negro das rochas, desfeitas em vento salgado... Gosto de ouvir a voz do mar, a única música cujos acordes são impossíveis de decorar ou prever, porque é sempre diferente... E no entanto, tão igual a si própria, na canção que acalma ou perturba... Sempre intensa, como uma poesia que não sabemos de cor mas cujas palavras reconhecemos nas primeiras sílabas.
Hoje dizia-se que de tarde, o mar galgaria a estrada. Acontece raramente, mas é um espectáculo lindíssimo... E quando o mar recua, deixa a areia abandonada nos passeios, em montes de uma branquidão inesperada, com salpicos de luz e brilho...
Chamo-lhe meu, sim. Chamo-lhe meu porque entre muitas outras coisas, o mar traz-me as palavras de volta... Quando julgo que as perdi, o mar abre as portas do meu peito e permite o regresso das palavras... De todas as palavras.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

No palco da vida


Não há forma nenhuma de se verificar qual das decisões é melhor, porque não há comparação possível. Tudo se vive imediatamente pela primeira vez, sem preparação. Como se um actor entrasse em cena sem nunca ter ensaiado.

Milan Kundera, A Insustentável Leveza do Ser

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Em dois olhares


Esta vista de mar, solitariamente,
dói-me. Apenas dois mares,
dois sóis, duas luas
me dariam riso e bálsamo.
A arte da Natureza pede
o amor em dois olhares.

Fiama Hasse Pais Brandão, do amor, IV

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Asas e raízes


Dê a quem você ama, asas para voar, motivos para voltar e raízes para ficar.

Dalai Lama

domingo, 6 de fevereiro de 2011

O horizonte a norte da dor


Percorro com mansidão os labirintos mornos da memória e deixo que a cada esquina as recordações me rebentem no rosto como granadas... Quero decantar uma música, guardá-la pousada nos lábios e bebê-la devagar, como se fosse um vinho vermelho escorrendo espesso de doçura pelas margens do meu corpo, pousando-me na pele, perfumando-a de saudade... Saboreio as imagens que desfilam em paradas de felicidade, sentinelas fiéis de outras vidas que (ainda não) vivemos e que (ainda não) se perderam... Dizer-te baixinho que há um horizonte mais a norte da dor e que chegaremos juntos e inteiros, depois do tempo que se queima, depois do tempo que nos queima... Sorrir-te... e contar-te o tamanho do meu sonho, cravar-to no coração enquanto em silêncio passam lentos os barcos cortando o sal do vento, e o sol morre devagar fazendo sangrar os céus a ocidente.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

O peso das palavras


No prato da balança um verso basta para pesar no outro a minha vida.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A música das palavras


Pescador da barca bela,
Onde vais pescar com ela,
Que é tão bela,
Oh pescador?


Não vês que a última estrela
No céu nublado se vela?
Colhe a vela,
Oh pescador!


Deita o lanço com cautela,
Que sereia canta bela...
Mas cautela,
Oh pescador!


Não se enrede a rede nela,
Que perdido é remo e vela
Só de vê-la,
Oh pescador.


Pescador da barca bela,
Inda é tempo, foge dela,
Foge dela,
Oh pescador!


Almeida Garrett, "Barca Bela" in Folhas Caídas

(Aniversário de Almeida Garrett - 4 de Fevereiro de 1799, na cidade do Porto)

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Shuuut... É Fevereiro.


É Fevereiro.
Finalmente, é Fevereiro.
Olho a data que pintei a cor de rosa na página macia da agenda e conto os dias que faltam... Espero o tempo, vejo-o passar na sua cruel indiferença e um estranho, um novo medo espalha o silêncio dentro de mim... O mais pequenino de todos os meses encerra no ventre a maior de todas as respostas, a mais funda, a mais importante para mim. E eu sei, na expectativa da espera, este será um longo mês, com noites infinitas e dias intermináveis, com horas de ansiedade solitária, sólida como um muro...
É Fevereiro. Já é Fevereiro... Shuuut... Não digas nada...
(E se o meu castelo é de areia...?)
(E se eu não fui capaz...?)