quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

FELIZ ANO NOVO!


A todos os que por aqui passam e se demoram nas minhas palavras, desejo um 2009 cheio de felicidade...
Eu só peço tempo... para continuar a tocar as estrelas...

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Atrevo-me...


Atreve-se o poema
insinua-se, escorregadio...
desliza silencioso
nas pontas dos meus dedos.
Ganha corpo, impõe-se
nas ondas das palavras...

Escolho as mais doces,
as mais suaves, as de cor mais bonita
e com travo a maresia...
Procuro as palavras claras,
luminosas, como o teu sorriso de sol...

Preciso de dizer-te como é bom
atravessar contigo as estradas da vida,
Preciso que saibas que quero
as tuas mãos nas minhas
para romper os caminhos
do novo ano...

Atrevo-me no poema,
arrisco a prosa e a poesia,
só para te falar de amor.

Só para te dizer que te amo.


domingo, 28 de dezembro de 2008

Farrapos de memória


Nas traseiras da casa da minha avó, a seguir ao quintal, havia uma série de casinhas pequeninas clandestinas a que chamavam ilha. Na última casa da ilha, morava um pintor. Ninguém sabia o seu nome, a sua idade, a sua proveniência... De estatura alta e evidente magreza, tinha o cabelo todo branco e um bigode amarelecido pelo tabaco. Vivia sozinho, não falava com ninguém e nós, as crianças, tínhamos dele um medo terrível... Ninguém se atrevia a dirigir-lhe a palavra e eu gostava de o espreitar pela janela escancarada, enquanto pintava. Com o queixo apoiado no peitoril de madeira corroída e em bicos dos pés, ficava a observá-lo, fascinada, pintando indiferente ao mundo, ao correr das horas, o cigarro eternamente pendurado nos lábios, arrastando as palavras lentamente numa melopeia estranha, incompreensível, quase inaudível. Hoje acho que ele sabia que eu ali estava mas a minha presença era para ele tão indiferente como a das dezenas de gatos vadios que encontravam guarida naquele ateliê inusitado. O universo era dentro dele. A vida acontecia num lugar a que só ele tinha acesso, onde não deixava entrar mais ninguém. Na ponta dos seus dedos, nasciam fantasticamente mares muito azuis, sóis alaranjados, ondas verdes e amarelas de uma praia que só ele via... De vez em quando assobiava... e era uma música alegre, sem escorrências de nostalgia, de saudade ou solidão alguma, uma música que estalava ao sol como fogo de artifício na pequena ilha... e eu ficava ali, seduzida pela estranha criatura, supostamente escondida na minha inocência infantil, a vê-lo criar mundos coloridos e fazer nascer sons que lhe ecoavam lá dentro...
Um dia as janelas da casinha não se abriram. Os vizinhos estranharam... Outro dia, mais outro... E depois o relato breve, feito sem pormenores pela minha avó: o pintor morrera, encontraram-no morto em casa, na sua solidão, no estranho mundo paralelo que habitara entre nós. Partira tão só como chegara...
Ninguém lhe sentiu a falta. Talvez só para mim, a ilha nunca mais foi a mesma, com as janelas da última casa encerradas para sempre, vedando-me o olhar aos quadros pintados grosseiramente, vozes e gritos de liberdade de um ser humano estranhamente só, que assobiava a felicidade em ondas de alegria pura e pintava o mar de um tom inesquecível.

sábado, 27 de dezembro de 2008

Sentido único


Um dia, quando olhares para trás, verás que os dias mais belos foram os dias em que lutaste.

Sigmund Freud

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

FELIZ NATAL!



A todos os visitantes deste espaço, desejo uma noite de paz e felicidade...
Um Natal cheio de amor e boa vontade.


terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Noite perfumada



O cheiro invade toda a casa, sobe etéreo a escadaria, ocupa o piso de cima... Está por todo o lado, este cheiro mesclado de canela, mel, limão... este cheiro quente a lenha ardendo com serenidade, crepitando alegre na minha lareira, estalando em gargalhadas queimadas com arrastada lentidão, este cheiro a velas e biscoitos acabados de cozer... É o perfume do Natal. Esta noite escorre já das paredes, infiltra-se nos armários e nos cantos mais escuros, inunda as gavetas numa onda morna de saudade. A memória não me trai, este é o cheiro do Natal, o mesmo de que lembro desde que existo, o cheiro do Natal da minha infância. Sento-me cansada a olhar a serenidade da casa adormecida... É um cansaço bom, o cansaço quente e perfumado da véspera de Natal. Todos os anos se repete e é sempre o mesmo. Todos os anos sinto esta magia que se aproxima silenciosa, se insinua no escorregar das horas, deixa o coração ternurento e agasalhado... Deixa o meu corpo pesado, cansado, desejando repousar no teu abraço, querendo encostar a cabeça no teu peito e ouvir o bater do teu coração, nesta quietude perfumada de uma noite mágica e única que se faz anunciar com meiguice...
A noite de Natal.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Cá dentro


Há momentos tão únicos, tão especiais, que não importa onde estamos porque a vida acontece dentro de nós e não lá fora.

sábado, 20 de dezembro de 2008

Palavras...


E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos

David Mourão-Ferreira, E por vezes

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O relatório


É oficial: estou a ficar demente. Insana. Psicótica.
Desde que me lembro, sempre tive um medo terrível de me esquecer de datas ou documentos importantes, de não cumprir prazos, de falhar de algum modo profissionalmente... Nas alturas de muito trabalho, dou comigo a rever a agenda vezes sem conta para confirmar as datas das reuniões, a verificar até à exaustão que todos os relatórios, fichas, planos, gráficos, actas, estão prontinhos e perfeitos. E hoje, como de costume, comecei a preparar o material para a reunião de sexta-feira, para que nada falhe, para que nenhum documento seja esquecido por algum colega mais distraído. E faltava mesmo um documento, um relatório. No intervalo, abeirei-me da colega responsável pela falha e lembrei-lhe da necessidade absoluta de ter o papelito pronto até sexta-feira. Ela olhou-me visivelmente desnorteada e disse-me que já mo tinha dado na semana passada. Foi a minha vez de mostrar surpresa e garanti-lhe que não, que ela estava baralhada, talvez tivesse sido a outro Director de Turma... ou se calhar tinha sido colocado directamente no dossiê da Direcção de Turma... Talvez num errado... Entreguei-to em mãos, não te lembras?- afiançava ela, o olhar cheio de uma enervante certeza. Não, não me lembrava... Mas dei-lhe o benefício da dúvida e dediquei-me à ingrata tarefa de esvaziar a minha gorducha e pesada pasta. Verifiquei, com gestos nervosos, todos os papéis, todos os envelopes, todos os dossiês, um por um, e... nada. Nem sinal do relatório. A irritação aumentava mas tentei serenar... talvez não tivesse visto bem... repeti a busca, agora ainda com mais cuidado. Nada de novo. Do relatório nem cheiro, nem rasto. E agora? Que maçada ter de andar atrás dos colegas, pedir pelas alminhas, zelar para que sejam cumpridas todas as formalidades atempadamente, lembrar da necessidade de ter tudo pronto para que a reunião corra sobre rodas... Enfim... Voltei a falar com a colega e calmamente expliquei-lhe que não tinha o relatório e que ela teria de fazer outro. Não gostou. Não gostou nadinha. Mas eu dei-to!-reafirmava já sem ocultar os nervos. Pois, mas eu não o tinha, paciência, se calhar tinha-o perdido... (como é que se perde um relatório?) era mesmo necessário fazer outro. E com esta regressei a casa e tentei serenar. Mas não estava bem, uma inquietude áspera roçava-me a pele, desviava-me a atenção dos gestos rotineiros, sobressaltava-me a concentração. Decidi procurar de novo, esventrar a pasta e radiografá-la se necessário fosse... Mas não foi necessário... Mal a abri, quase imediatamente os meus olhos tropeçaram numa folha extremamente familiar... puxei-a e não queria acreditar...! O relatório fantasma, preso com um clip a um outro documento, sorria-me desdenhosamente, trocista, atirando-me à cara toda a minha nervosa cegueira... Ele estivera sempre ali, o tempo todo, e eu tinha passado por aquele sorriso escancarado vezes sem conta e não o tinha visto, aquele riso escarninho e desprezível de quem troça da desgraça alheia, soara com certeza alto, muito alto e eu não o tinha ouvido...
Amanhã vou pedir desculpas à colega. Muitas vezes, mil vezes, e implorar-lhe que seja paciente comigo... É que eu estou a ficar demente. Insana. Psicótica.

domingo, 14 de dezembro de 2008

sábado, 13 de dezembro de 2008

Fundo...


"Conheço-te muito bem!"- disparaste tu com um olhar de fogo que não deixava lugar a réplicas. E eu calei-me... mas apetecia-me dizer-te que uma pessoa é quase sempre a ponta visível de um iceberg... Que uma pessoa tem abismos, tem lugares escondidos, tem precipícios onde se debruça desafiando o equilíbrio. Uma pessoa tem muitas vezes portas fechadas à chave, fantasmas adormecidos nos tectos poeirentos, tem oceanos profundos dentro do peito. Uma pessoa tem lugares desconhecidos aonde nunca foi, aonde nunca se atreveu a ir... Uma pessoa tem gavetas com fundos falsos e jardins proibidos, tem buracos negros como o universo...
Apeteceu-me mandar-te calar porque devias saber que uma pessoa é sempre muitas pessoas...

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Palavras aladas


Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas vão-se dos pombais apenas
Raia sanguínea e fresca a madrugada...

E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais.

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam
E eles aos corações não voltam mais...

Raimundo Correia, As Pombas

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

As coisas que tu dizes...


Juras a pés juntos que o homem nunca foi à lua e não há quem te demova. Esta verdade inabalável é dita com um sorriso trocista, levantando a ponta do véu da suspeita transformada em certeza irredutível: filmagens de estúdio, montagens feitas com a ajuda de sofisticados computadores.Nada mais fácil do que simular um cenário desértico e branco, uma alunagem feita por gente envergando roupas estranhas e volumosas. E o povo néscio engole a história. Dizes tu. Eu não te contrario.
Do mesmo modo, tens a estranha teoria de que os mortos não se vão embora, de que ficam connosco e vivem a nosso lado, traindo-se no ranger das portas e dos soalhos, no estalar das vidraças, no estremecer das flores nas jarras, nas correntes de ar inesperadas e improváveis, nas sombras súbitas que se te atravessam no corredor da casa tranquila e vazia. O teu gato consegue vê-los, aos teus mortos que te povoam as assoalhadas cintilantes, quando fica estranhamente quieto, pupilas enormes e negras fixas num ponto qualquer, o pêlo eriçado e o corpo estranhamente estacado... todo ele nervos e atenção de predador selvagem. Os mortos que o teu gato vê, envelhecem, adoecem, ficam rabujentos ou alegres, riem e cantam, choram de tristeza... e não te metem medo... As coisas que tu dizes!...
Acreditas também que aqui expiamos os nossos pecados, pagamos o preço dos erros cometidos em muitas outras vidas... e que o Homem e a Mulher são apenas metades de uma laranja que Deus cortou e espalhou aos sete ventos quando criou o mundo. Por este motivo, só nos completamos com um único ser humano à face da terra. Um único. É pois missão de cada um de nós procurar a metade onde encaixamos, e quando a encontrarmos não devemos desviar o olhar, devemos lutar para a preservar, destruir todos os muros que nos separam.Quando isto não acontece, a nossa metade procurar-nos-á em outra vida, fazendo-se ouvir de modo estranho: objectos que desaparecem misteriosamente ou são trocados de lugar sem alguém lhes mexer, o rádio que subitamente toca mais alto, um cheiro estranho a perfume vindo do nada, invadindo todos os aposentos, uma luz que falha por instantes... Está sempre a acontecer e são eles. Dizes tu. São eles brincando connosco, são eles que se riem da história do Homem que foi à lua e afinal não consegue curar o cancro e a SIDA, não sabe como salvar os oceanos, como evitar as guerras, a fome, a dor e a miséria... As coisas que tu dizes! Ir à lua é tão fácil! Basta um computador e uma simulação perfeita. Difícil, difícil mesmo, é encontrar a metade da nossa laranja. Por isso os mortos de alguém nos acariciam o cabelo ou nos puxam os pés na cama em longas noites de insónia. São apenas meias laranjas que procuram a outra parte, incansavelmente, como uma sina escrita por um deus cigano que do Além tatuou palavras imortais e feitiços inquebráveis nas palmas das nossas mãos.
As coisas que tu dizes...!

sábado, 6 de dezembro de 2008

Palavras de Amor


Nunca pensei. Achei que ia ser para sempre: aquela coisa ao mesmo tempo boa e inquietante, colada às costelas, indizível, tão forte, uma coisa esquisita, suave e alucinante ao mesmo tempo, sim, várias coisas ao mesmo tempo, que eu trazia dentro do corpo, inalienável, como uma doença dos rins ou dos pulmões, mas uma coisa incurável (...)
Nada disso. Caminhava na rua sempre com esta sensação dentro de mim, esta felicidade, esta benção, vejo agora que era maldição, de que não me podia libertar mas era minha, tão minha como as minhas pernas ou os meus braços, tão minha como do meu pobre e inquieto coração.
(...)
- Amor? Não sei, não tenho a certeza se era amor. Acho que era muito mais. Uma coisa sem nome. Não, isto era muito mais...

Rosa Lobato de Faria, As Esquinas do Tempo

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Sentido único


O jogo do Amor é um jogo de forças. Quanto mais se ama mais fraco se é.

Vergílio Ferreira, Conta-Corrente

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

A propósito de política...


Anda a apetecer-me há muito tempo falar da Sra. Ministra da Educação... mas felizmente tenho-me segurado.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Boa-noite avó


A minha avó era uma pessoa doce. Era um ser humano bom, muito bom. Possuía um altruísmo que toda a vida tentei imitar e adorava rir e perder-se em conversas de todo o género. A sua enorme sabedoria popular não lhe dava ares de altivez, pelo contrário, era humilde como uma flor campestre. Ensinou-me a cozinhar, a bordar, a fazer crochet e malha, a arrumar uma gaveta, a limpar a casa, a dobrar lençóis e a pôr a mesa... A minha avó fazia-me os vestidos para as bonecas e punha cera no chão da casa de joelhos, a cantarolar. Era ela quem me penteava o cabelo todos os dias antes de sair para a escola, com a boca cheia de ganchos que me espetava cuidadosamente na indomável cabeleira aos caracóis. A minha avó cheirava a canela e a alfazema. A minha avó tinha uma letra bonita, redondinha, que desenhava a lápis quando fazia as listas de compras com a língua de fora... A minha avó ensinou-me as letras, os números, a tabuada e as primeiras contas. Eu amava-a muito. Perdi-a há catorze anos e desde então, raro é o dia em que não a evoque com carinho e muita saudade. Às vezes, tenho muito medo de esquecer o seu sorriso e procuro então as fotografias que lhe tirava com uma Canon pesada demais para as minhas mãos pequeninas, depois de ela se ter penteado porque fazia questão de estar bonita. A minha avó era bonita. E adorava provérbios, possuía um vasto repertório e a todo o passo, em qualquer situação, lá disparava um adágio a propósito. Foi com ela que aprendi a gostar de provérbios e aprendi-os todos. Mas havia um que eu não entendia, nunca compreendi, e era o seu preferido. Ela bem me explicava, bem tentava, mas as palavras ficavam a pairar em mim sem fazer algum sentido... Hoje compreendo-o finalmente. Hoje sei, avó, o que querias dizer quando deixavas cair o teu provérbio preferido. Talvez seja por isso que venho evocar-te hoje, para te dizer que tu tinhas razão quando me dizias com o olhar subitamente cauteloso ou definitivamente nublado: Meu amor, "O Homem faz planos e Deus ri-se".

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Em Dezembro


Impossível não notar... A cidade engalanou-se, vestiu-se de luz e cor, há música nas ruas, nas lojas alegres, onde as pessoas se acotovelam já a comprar os presentes que a quadra exige... Por todo o lado, pais natais, bonecos de neve, renas, bolas coloridas, guirlandas, estrelas, laços e fitas abraçando embrulhos, sinos e presépios, cânticos e sorrisos, acções de beneficência e vendas de caridade, filantropia e solidariedade a jorros...
E no entanto, impossível não notar... Os passos apressados de quem percorre as montras de olhar vazio, as mãos carregando o peso de mil angústias, os corações vazios de sonhos. Tanta gente só, tantos idosos tristes e abandonados, tanto ser humano transpirando frio e fome, tantos gestos denunciando um negro desalento... Nas lojas quentes, nas ruas agora tão bonitas, lado a lado, tanta desigualdade nas emoções de corações iguais...
O Natal não tarda... mas não chega a todo o lado e não é para todos.
Impossível não notar.
Em Dezembro.

1 de Dezembro


Dia Mundial da Luta contra a SIDA.
Aqui fica o meu abraço.