Na ilha por vezes habitada do que somos, há noites
manhãs e madrugadas em que não precisamos de
morrer.
Então sabemos tudo do que foi e será.
O mundo aparece explicado definitivamente e entra
em nós uma grande serenidade, e dizem-se as palavras
que a significam.
Levantamos um punhado de terra e apertamo-la
nas mãos.
Com doçura.
Aí se contém toda a verdade suportável: o contorno, a
vontade e os limites.
Podemos então dizer que somos livres, com a paz e o
sorriso de quem se conhece e viajou à roda do
mundo infatigável, porque mordeu a alma
até aos ossos dela.
Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres
como a água, a pedra e a raiz.
Cada um de nós é por enquanto a vida.
Isso nos baste.
José Saramago, "Na ilha por vezes habitada" in Provavelmente Alegria
4 comentários:
Lindo!
Coloquei este texto nas minhas searas, exactamente com um "Até sempre".
Só agora vi que escolheste o mesmo, o que prova claramente a proximidade das nossas sensibilidades literárias.
Tenho de te dizer que gostei muito do "post" anterior, também.
Boa semana!
Um beijo
Infelizmente, aquele foi um dia em que ele precisou de morrer. talvez agora ele veja para lá do contorno.
Um texto bem seleccionado numa homenagem possível.
Abraço
Penso que o Saramago ficou conhecido e foi amado sobretudo pela sua prosa, mas a poesia é de uma beleza sufocante... E este é, para mim, o seu poema mais inquietante... e belo. Ainda bem que também o escolheste, Lídia :)
Um beijinho, Amiga
Obrigada AC, pelas palavras e pela companhia.
Um beijinho
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